sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

Cortes de Almeirim de 1580 – Para assinalar os 434 anos da morte do Cardeal D. Henrique

Retrato do Cardeal-Rei D. Henrique, no Mosteiro de Tibães

A 31 de Janeiro de 1580 morria no Paço de Almeirim o Cardeal-Rei D. Henrique, no decorrer das Cortes de Almeirim. Estas, apesar de terem sido inclusivas, eram de extrema importância, pois destinavam a designar o sucessor do Cardeal-Rei, já velho e doente, e que não tinha herdeiros diretos.

Apesar de existirem outros, eram três os principais pretendentes ao trono, todos sobrinhos de D. Henrique e netos de D. Manuel I, a saber:

- D. Catarina de Bragança, filha do Infante D. Duarte e da 4.ª Duquesa de Bragança, D. Isabel. Segundo alguns autores, era a candidata preferida do Cardeal, e que utilizou o argumento de além de ser filha legítima, era descendente de D. Manuel I por via masculina.

- D. Filipe II, rei de Espanha, filho da Infanta D. Isabel e do imperador Carlos V. Espanha era uma superpotência na altura, e Filipe II era um monarca bastante poderoso. Considerava-se o herdeiro natural, por ser homem e ser filho legítimo.

- D. António, prior do Crato, filho ilegítimo do Infante D. Luís. O Cardeal não gostava dele, contudo era o candidato preferido do povo.

As Cortes Reuniram-se na Sala da Rainha, e tiveram início a 11 de Janeiro. Os nobres e clérigos ficaram instalados no Paço de Almeirim, enquanto que os procuradores dos concelhos ficaram acomodados no Convento de S. Francisco, em Santarém. A oração de abertura foi proferida por D. António Pinheiro, Bispo de Leiria, um dos apoiantes do rei de Espanha.

O Cardeal-Rei foi descrito como estando “sentado num largo cadeirão de braços, com o ceptro na mão, tão magro, tão malicento, tão desfigurado pela febre, mais parecia múmia que homem vivo” (Vermelho, 1951: 53).

Fresco alusivo à audiência de Febo Moniz nas Cortes de Almeirim.
Palácio da Justiça de Santarém. Autoria de Jaime Barata 

Eram muitos os nobres fidalgos apoiantes de D. Filipe, fosse por acharem que ele era o verdadeiro sucessor, fosse por terem sido aliciados pelas suas riquezas. Para além do bispo de Leiria, contavam-se também Cristóvão Moura e D. João de Mascarenhas. Era este Cristóvão de Moura, assim como o Duque d’ Ossuna os mais destacados defensores da causa filipina nestas cortes. Recusaram qualquer meio de se puder chegar ao sucessor (fosse a eleição, fosse a nomeação pelo Cardeal-Rei), pois para eles o verdadeiro sucessor era D. Filipe e isso não oferecia discussão.

Os procuradores das cidades e vilas insistiam nestas cortes para uma eleição por cabeça. Contudo, os partidários de D. Filipe e D. Catarina bloquearam esta ação, pois o número de votos poderia ser favorável a D. António.

Alguns autores referem que o Cardeal estava à beira de nomear D. Catarina como sucessora. Contudo, não o fez, pois tinha medo que a poderosa força armada de D. Filipe II invadisse o país, e o tomasse pela força.

A 15 de Janeiro, D. António Pinheiro, dirige-se ao Convento de S. Francisco, onde apresenta um discurso que dava como herdeiro preferencial ao trono Filipe II. Volta a 18 de Janeiro, com um argumentos mais claros, onde era pretensão superior de D. Filipe II face a D. Catarina ao trono. Contudo, procurava-se um consenso e não uma imposição. Assim, nesse mesmo dia, dois procuradores do povo, entre os quais Febo Moniz, de Lisboa, dirigem-se a Almeirim e procuram convencer o clero e a nobreza em defesa do Reino, ou seja, na escolha de um rei português. Diz-se que Febo Moniz, na altura com 64 anos, se dirigiu ao Cardeal-Rei com as seguintes palavras, constantes numa placa alusiva às cortes, na cidade de Almeirim:

Entregue vossa alteza o reino a um príncipe português e todos lhe beijarão a mão.  

Placa evocativa das cortes de 1580 em Almeirim, aposta num edifício localizado no local onde se existiu o Paço Real.

Uma carta datada de 27 de Janeiro, enviada para Espanha por André Gaspar “corso, agente secreto, segundo parece” (Herculano, 1844: 169), dá conta do estado de saúde de D. Henrique, que melhorara um pouco face a três dias muito difíceis que tinha tido, e que muitos julgaram que não aguentasse.

A 29 de Janeiro, ao início da noite, D. Catarina chega a Almeirim e é aclamada. Contudo, da sua pequena reunião com o enfermo tio-rei, não houve resultado algum.

Às 11 horas da noite de dia 31 de Janeiro, o Cardeal-Rei D. Henrique morre em Almeirim, no dia em que completava 68 anos. Deixava o trono vago, e sem ter definido um herdeiro. É sepultado na Capela de Santa Maria, do Paço Real de Almeirim, sendo em 1682 os seus restos mortais transferidos para o túmulo do Mosteiro dos Jerónimos, por ordem de D. Pedro II.

Quanto ao governo do reino, fica entregue a cinco procuradores: o Arcebispo de Lisboa (que se inclinava para D. Catarina), D. João de Marcarenhas, Francisco de Sá, Diogo Lopes (partidários de Filipe II) e D. João Teles de Meneses (adepto de D. António). A História conheceu o curso que lhe conhecemos, tendo sido o rei de Espanha proclamado também rei de Portugal.

Bibliografia:
CLAUDIO, António (1990). Almeirim: Esboço Monográfico. S/l: Ed. CMA.

HERCULANO, Alexandre (1844). “Pouca luz em muitas trevas”, Panorama, (pp. 137 – 193).

PEREIRA, José Gerardo Barbosa (2012). Sociedade, elites e poder em Pernambuco no século XVII. Dissertação de Doutoramento apresentada à Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa.

SERRÃO, Joaquim Veríssimo (2001). História de Portugal: O Século de Ouro (1495-1580), Vol. III, 3.ª Ed. S/l: Ed. Verbo.


VERMELHO, José (1951). Al-Meirim: Velharias desta Vila Tão Mui Nobre

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