Retrato do Cardeal-Rei D. Henrique, no Mosteiro de Tibães
A
31 de Janeiro de 1580 morria no Paço de Almeirim o Cardeal-Rei D. Henrique, no
decorrer das Cortes de Almeirim. Estas, apesar de terem sido inclusivas, eram de extrema
importância, pois destinavam a designar o sucessor do Cardeal-Rei, já velho e
doente, e que não tinha herdeiros diretos.
Apesar
de existirem outros, eram três os principais pretendentes ao trono, todos
sobrinhos de D. Henrique e netos de D. Manuel I, a saber:
- D. Catarina de Bragança, filha do Infante D. Duarte e da 4.ª
Duquesa de Bragança, D. Isabel. Segundo alguns autores, era a candidata preferida do Cardeal, e que
utilizou o argumento de além de ser filha legítima, era descendente de D.
Manuel I por via masculina.
- D. Filipe II, rei de Espanha,
filho da Infanta D. Isabel e do imperador Carlos V. Espanha era uma superpotência
na altura, e Filipe II era um monarca bastante poderoso. Considerava-se o herdeiro
natural, por ser homem e ser filho legítimo.
- D. António, prior do Crato,
filho ilegítimo do Infante D. Luís. O Cardeal não gostava dele, contudo era o
candidato preferido do povo.
As
Cortes Reuniram-se na Sala da Rainha, e tiveram início a 11 de Janeiro. Os
nobres e clérigos ficaram instalados no Paço de Almeirim, enquanto que os
procuradores dos concelhos ficaram acomodados no Convento de S. Francisco, em
Santarém. A oração de abertura foi proferida por D. António Pinheiro, Bispo de
Leiria, um dos apoiantes do rei de Espanha.
O
Cardeal-Rei foi descrito como estando “sentado num largo cadeirão de braços,
com o ceptro na mão, tão magro, tão malicento, tão desfigurado pela febre, mais
parecia múmia que homem vivo” (Vermelho, 1951: 53).
Fresco alusivo à audiência de Febo Moniz nas Cortes de Almeirim.
Palácio da Justiça de Santarém. Autoria de Jaime Barata
Eram
muitos os nobres fidalgos apoiantes de D. Filipe, fosse por acharem que ele era
o verdadeiro sucessor, fosse por terem sido aliciados pelas suas riquezas. Para
além do bispo de Leiria, contavam-se também Cristóvão Moura e D. João de
Mascarenhas. Era este Cristóvão de Moura, assim como o Duque d’ Ossuna os mais
destacados defensores da causa filipina nestas cortes. Recusaram qualquer meio
de se puder chegar ao sucessor (fosse a eleição, fosse a nomeação pelo
Cardeal-Rei), pois para eles o verdadeiro sucessor era D. Filipe e isso não
oferecia discussão.
Os
procuradores das cidades e vilas insistiam nestas cortes para uma eleição por
cabeça. Contudo, os partidários de D. Filipe e D. Catarina bloquearam esta
ação, pois o número de votos poderia ser favorável a D. António.
Alguns
autores referem que o Cardeal estava à beira de nomear D. Catarina como
sucessora. Contudo, não o fez, pois tinha medo que a poderosa força armada de D.
Filipe II invadisse o país, e o tomasse pela força.
A
15 de Janeiro, D. António Pinheiro, dirige-se ao Convento de S. Francisco, onde
apresenta um discurso que dava como herdeiro preferencial ao trono Filipe II.
Volta a 18 de Janeiro, com um argumentos mais claros, onde era pretensão
superior de D. Filipe II face a D. Catarina ao trono. Contudo, procurava-se um
consenso e não uma imposição. Assim, nesse mesmo dia, dois procuradores do
povo, entre os quais Febo Moniz, de Lisboa, dirigem-se a Almeirim e procuram
convencer o clero e a nobreza em defesa do Reino, ou seja, na escolha de um rei
português. Diz-se que Febo Moniz, na altura com 64 anos, se dirigiu ao
Cardeal-Rei com as seguintes palavras, constantes numa placa alusiva às cortes,
na cidade de Almeirim:
Entregue vossa alteza o reino a um
príncipe português e todos lhe beijarão a mão.
Placa evocativa das cortes de 1580 em Almeirim, aposta num edifício localizado no local onde se existiu o Paço Real.
Uma
carta datada de 27 de Janeiro, enviada para Espanha por André Gaspar “corso,
agente secreto, segundo parece” (Herculano, 1844: 169), dá conta do estado de
saúde de D. Henrique, que melhorara um pouco face a três dias muito difíceis
que tinha tido, e que muitos julgaram que não aguentasse.
A
29 de Janeiro, ao início da noite, D. Catarina chega a Almeirim e é aclamada.
Contudo, da sua pequena reunião com o enfermo tio-rei, não houve resultado
algum.
Às 11 horas da noite de dia 31 de Janeiro, o Cardeal-Rei D. Henrique morre em
Almeirim, no dia em que completava 68 anos. Deixava o trono vago, e sem ter
definido um herdeiro. É sepultado na Capela de Santa Maria, do Paço Real de
Almeirim, sendo em 1682 os seus restos mortais transferidos para o túmulo do
Mosteiro dos Jerónimos, por ordem de D. Pedro II.
Quanto
ao governo do reino, fica entregue a cinco procuradores: o Arcebispo de Lisboa
(que se inclinava para D. Catarina), D. João de Marcarenhas, Francisco de Sá,
Diogo Lopes (partidários de Filipe II) e D. João Teles de Meneses (adepto de D.
António). A História conheceu o curso que lhe conhecemos, tendo sido o rei de
Espanha proclamado também rei de Portugal.
Bibliografia:
CLAUDIO,
António (1990). Almeirim: Esboço
Monográfico. S/l: Ed. CMA.
HERCULANO,
Alexandre (1844). “Pouca luz em muitas trevas”, Panorama, (pp. 137 – 193).
PEREIRA,
José Gerardo Barbosa (2012). Sociedade,
elites e poder em Pernambuco no século XVII. Dissertação de Doutoramento
apresentada à Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa.
SERRÃO, Joaquim Veríssimo (2001). História
de Portugal: O Século de Ouro (1495-1580), Vol. III, 3.ª Ed. S/l: Ed.
Verbo.
VERMELHO,
José (1951). Al-Meirim: Velharias desta
Vila Tão Mui Nobre.
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