terça-feira, 19 de maio de 2015

António Roiz e Maria Cordeira – um casal da Ribeira de Muge no séc. XVIII – Parte I: Família

Os assentos paroquiais constituem uma privilegiada forma de conhecer as sociedades de séculos passados. Quem eram os mais importantes, mortalidade, deslocações entre localidades, compadrios. Por ser uma paróquia muito isolada e rural, talvez não houvesse todo o empenho e brio nos assentos da Paróquia de Santo António da Raposa que outras terão. Contudo, também conseguimos através destes, fazer algumas leituras da sociedade do séc. XVIII nesta freguesia do médio curso da Ribeira de Muge.

Já nos detivemos em Leonarda Maria e no casal Diogo Vieira e Maria Nunes. Hoje poderemos apresentar um outro casal: António Roiz (ou Rodrigues) e Maria Cordeira. Contudo, os registos sobre estes são de tal ordem, que decidimos criar uma série de publicações sobre os mesmos.

À semelhança de outros, não temos acesso ao registo de casamento de António Roiz e Maria Cordeira. Deduzimos que já seriam casados em 1711, quando nos surge o assento de batismo de um rapaz seu filho. Contudo, não podemos sequer afirmar que este seria o seu filho mais velho, visto que os assentos de batismo, que tenhamos conhecimento, só começaram a ser efetuados nesse mesmo ano, sendo esse o segundo do livro.

Em 1515, mais precisamente a 19 de agosto, morre António Roiz Manzorro, morador no Moinho dos Gagos (onde também vivia António Roiz e Maria Cordeira), sendo sepultado na Igreja de Santa Maria de Marvila, em Santarém. O assento menciona que este era casado com Maria Cordeira. Sabemos que estamos a falar de dois “António Roiz” diferentes, uma vez que o principal deste artigo estará vivo até aos anos 30 do séc. XVIII. Podemos então perguntar-nos se seriam familiares. Pai e filho? Tio e sobrinho? Primos? Outro pormenor interessante é o nome da mulher de ambos: Maria Cordeira. Será uma confusão do padre? Ou será que existiram mesmo duas “Marias Cordeiras”, casadas com um António Roiz que viveram no Moinho dos Gagos neste período? Mais à frente voltaremos a esta questão.


Esquema Genealógico dos Descentes de António Roiz e Maria Cordeira, tendo por base os registos paroquiais. Construído com a tecnologia My Heritage.

Dos assentos de batismo, casamento e óbito conseguimos determinar que António Roiz e Maria Cordeira tiveram cerca de nove filhos. De alguns só temos um registo, de outros temos vários e de outros temos dúvidas se serão ou não seus filhos. De qualquer forma, ficam os principais dados de cada um deles:

1. António Rodrigues: batizado em 1711, foram seus padrinhos João Nunes e Maria Roiz. Casou-se em 1737 com Maria Marques (da freg. De Vale de Cavalos), e vivia na altura na Várzea Redonda.

2. Maria: foi batizada em 1712, morando a família no Moinho dos Gagos. São mencionados como padrinhos António Roiz e Maria Cordeira. Perante isto, podemos levantar duas questões: ou se trata de um erro do padre, que repetiu o nome dos pais e padrinhos, e estes apenas deveriam estar num dos lados, ou efetivamente existiam dois casais a morar no mesmo local, com o mesmo nome. Será esta Maria filha de António Roiz e afilhada de António Roiz “Manzorro?”, ou vice-versa? Esta problemática levanta-nos o problema de não conseguirmos afirmar com certeza se será filha do “António Roiz” em questão, visto que até este é o único registo em que surge.

3. Vitorina: É batizada a 11 de novembro de 1714, morando a família no Moinho dos Gagos e sendo os seus padrinhos (João Roiz e Maria Madalena) moradores na Vila de Santarém. É o único registo seu de que temos conhecimento.

4. Domingas: É batizada em 1716, quando a família ainda vivia no Moinho dos Gagos, sendo os seus padrinhos os mesmos do seu irmão António. Neste assento é mencionado que estes viviam nos “Passos dos Negros”. Falecerá em 12 de novembro de 1734, quando a família já vive no Moinho dos Passos dos Negros.

5. Merenciana Rodrigues: Não temos conhecimento do seu assento de batismo. Sobre esta, sabemos que foi madrinha de batismo com o seu pai de uma menina, Maria, filha de Tomé e Maria Dias, em 1715. Todos estes eram moradores no Moinho dos Gagos. Será ainda enquanto a família de António Roiz morar ainda neste local que irá morrer Merenciana, a 10 de outubro de 1716. Esta será sepultada dentro da Igreja Paroquial de Santo António da Raposa "ao canto do altar, da parte direita", o que denotará alguma da importância que António Roiz e a sua família teriam no contexto da vida social da região na época, por ter sido sepultada num local de maior destaque.

6. Manuel António de Faria: Este filho de António Roiz e Maria Cordeira não deixa de ser intrigante, uma vez que o seu apelido em nada se ajusta ao dos pais. Apesar de não termos conhecimento do seu assento de batismo, é mencionado como padrinho várias vezes, com a sua mãe (em 1722 e 1729, sendo claramente aludido em ambos os registos que os padrinhos eram filho e mãe). É também padrinho de batismo com a sua irmã Páscoa como madrinha em 1728 e 1731; em 1724 com Giomar Lopes, cuja residência não é mencionada, mas cremos que não teria nada a ver com a família de António Roiz. A 11 de fevereiro de 1732 irá casar-se com Micaela Maria da Conceição, do Casal das Caneiras (freguesia da Lamarosa). Possivelmente ter-se-á mudado para este local (ou outro fora da paróquia), uma vez que deixa de surgir nos assentos paroquiais a partir desta data.

7. Juliana Rodrigues: Desta filha de António Roiz e Maria Cordeira sabemos que se casou a 8 de junho de 1722, quando a família vivia no Moinho dos Passos dos Negros, com Francisco Dias, do Junquinho (freguesia do Chouto). Foi testemunha do seu casamento João Nunes, morador no Passo dos Negros, e que já houvera sido padrinho de batismo de alguns dos seus irmãos. Apenas temos conhecimento do assento de óbito de uma das suas filhas, Maria, a 10 de maio de 1740, sendo que nesta altura vivia com o seu marido no Moinho dos Passos dos Negros. Esta morreu com os sacramentos da confissão e da extrema-unção, pelo que podemos inferir que já não seria uma criança; foi enterrada "na segunda sepultura junto ao caminho da parte da pia baptismal". Dois meses depois, a 27 de julho, o casal será padrinho de uma outra Maria, filha de António Vicente e Maria Nunes, moradores no Moinho dos Gagos.

8. Josefa Maria: à semelhança de alguns dos seus irmãos, não temos conhecimento da sua data de batismo. Apenas sabemos que é madrinha de batismo juntamente com o seu pai em 1723, 1725 e 1727 dos filhos de João Nunes e Maria Roiz. Ambas as famílias já tinham estabelecido relações de compadrio entre si anteriormente a estes batismos. Viviam os Roiz no Moinho dos Passos dos Negros e os seus compadres nos Passos dos Negros (em 1723) e no Arneiro da Volta (em 1725 e 1727). Sabemos também que Josefa Maria se irá casar em 19 de janeiro de 1729 com José Gonçalves, de Alpiarça, vivendo ainda no Moinho dos Passos dos Negros. Seria este José Gonçalves um trabalhador do Paço? Com efeito, por via dos assentos de batismo em que o casal é padrinho, assim como de alguns dos seus filhos, é mencionado que eram moradores nos “Passos dos Negros” (entre 1731 e 1736, num total de seis assentos). Foram os seus filhos batizados em 1731 (Maria), 1733 (Anástacio), 1734 (Maria), 1736 (António). Terão mais duas filhas (ambas Catarina), batizadas em 1737 e 1739, quando o casal já morava no Monte da Vinha. Temos registo do óbito de uma das “catarinas”, em 1739).

9. Páscoa Rodrigues: Desta filha de António Roiz e Maria Cordeira sabemos que foi madrinha por quatro vezes, com o seu pai (em 1729 e 1731), o seu irmão Manuel António Faria (1731) e com João Nunes (em 1734). Será neste mesmo ano que irá morrer, a 15 de novembro de 1734, apenas três dias depois da sua irmã Domingas. Fruto de uma epidemia viral, doença contagiosa ou simplesmente coincidência?

Fontes:
(1706-1741). Livro dos defuntos, dos baptizados e dos casados – Raposa (Sto. António).

segunda-feira, 5 de janeiro de 2015

O “Passo dos Negros” à luz dos registos paroquiais do séc. XVIII

Tomando como fonte principal os registos paroquiais do séc. XVIII, mais propriamente o primeiro livro deste registo, que medeia o período de 1706-1741 (ainda que incompleto), iremos desta feita tentar analisar quem viveria no espaço do Paço Real da Ribeira de Muge neste período.

O espaço que acreditamos ser aquele que hoje conhecemos como as ruínas do Paço Real da Ribeira de Muge era nesta época abrevado pelos padres que serviram a Paróquia de Santo António da Raposa como “Passos dos Negros” ou simplesmente “Passos”. De entre os vários assentos que temos com referência a este local, destacam-se dois casais: João Nunes e Maria Rodrigues (ou Maria Roiz*) e Domingos Nunes e Maria Lopes. Assim sendo, torna-se interessante seguir os passos destas famílias.
                                              
                                 Árvore Genealógica de João Nunes.

Elaboração através da tecnologia MyHeritage Family Tree Builder

Não temos conhecimento quando se casam João Nunes e Maria Rodrigues. Contudo, sabemos que pelo menos quatro dos seus seis filhos, quando foram batizados, viviam neste local: Isabel (1717), Maria (1719) Joana (1719) e António e José (1723 – gémeos?). Possivelmente aqui terão nascido, visto que as crianças eram batizadas ainda em muito pequenas – até devido à alta mortalidade infantil existente à época, e à necessidade de garantir a salvação da alma. Se estes foram abrevados pelo Padre Pedro de Barros, que colocava no assento o local onde viviam os pais do batizando, o mesmo não fazia o Padre Manuel Ribeiro, que batizou os dois primeiros filhos do casal: Manuel (1711) e João (1715). Seria que já nesta altura o casal aqui vivia?

Será também enquanto moradores no Paço Real da Ribeira de Muge que irá morrer uma filha ao casal (Joana – 1721). Em 1719 morre um Manuel Nunes, morador neste local, que podemos questionar-nos se teria algum parentesco com João Nunes (seria seu pai?). Sabemos que não será o seu filho mais velho, pois este irá casar-se em 1736 com uma viúva, Jacinta Maria. Curiosamente, é o mesmo ano em que volta a casar João Nunes (que ficara viúvo em 1729, quando vivia no Arneiro da Volta), com Leonor Nogueira. Os pais desta eram naturais do Moinho do Pinheiro e João Nunes vivia, à época, na Parreira.

Um outro aspeto curioso, que nos pode remeter para a importância social que teria João Nunes, são os padrinhos dos seus filhos. Paulo Soares da Mota, almoxarife do paço e residente em Almeirim é o padrinho dos seus cinco filhos mais velhos, juntamente com a sua mulher, Josefa Maria. Seria João Nunes um criado do próprio Paulo Soares da Mota, ou o responsável pelo paço na sua ausência, e que executava a gestão diária de acordo com as suas instruções? Quanto aos dois filhos mais novos, o padrinho é António Rodrigues, morador no “Moinho do Passo dos Negros”, e sua filha, Josefa. Evangelista (2009), aventa a possibilidade de Paulo Soares da Mota ter morrido no início da década de 20. Será por esta razão que não é padrinho destes dois últimos filhos de João Nunes? Contudo, a escolha de António Rodrigues não deixa de ser interessante. Este comprara o moinho em 1719, por 180 mil réis. Logo, podemos crer que se tratava de um proprietário não diremos abastado, mas com algumas posses. Estaremos então perante os mais “importantes” residentes da Ribeira de Muge?

Um outro aspeto curioso, ainda dentro deste mesmo tema, prende-se com o facto de, entre 1515 e 1525 estarem assentados 30 casamentos, sendo que em cinco destes, João Nunes foi testemunha, sendo assim uma pessoa frequente, nesta época, a quem se recorria para apadrinhar estas cerimónias. Destes, há a descartar o de Juliana Rodrigues com Francisco Dias, em 1722. Esta Juliana era moradora no Moinho do Passo dos Negros”, e filha de António Rodrigues, o que confirma o “compadrio” entre ambos. O mesmo é confirmado pelo número de vezes que foi padrinho de batismo, entre 1711 e 1719, em que num espaço de oito anos, João Nunes apadrinha seis crianças, cinco das quais em conjunto com a sua mulher.

No que diz respeito ao outro casal que na segunda década do séc. XVIII habitou os “Passos dos Negros”, verificamos que à partida, não seriam tão influentes como João Nunes e Maria Rodrigues. Com efeito, enquanto residentes neste local, apenas surgem quatro registos relativos a Domingos Nunes e Maria Lopes. Contudo, antes de nos determos sobre estes, devemos lançar-nos numa outra interrogação: existiria alguma ligação familiar entre Domingos Nunes e João Nunes? Seriam irmãos ou primos? Não o sabemos. Contudo, fica a interrogação levantada. É curioso que “Nunes” é um apelido recorrente nos “Passos dos Negros” nesta época. Para além destes dois sujeitos e Manuel Nunes, aludido anteriormente, existe também um António Nunes, que em 1728 fica viúvo de Sebastiana Santos (e no registo menciona que esta era pobre). Estariam todos eles ligados por laços familiares?

Árvore Genealógica de Domingos Nunes.
Elaboração através da tecnologia MyHeritage Family Tree Builder

São batizados no tempo em que foram moradores em “Passos dos Negros” três filhos de Domingos Nunes e Maria Lopes: Ana (1715), Mariana (1717) e Manuel (1721). Aliás, não temos conhecimento, segundo o disposto no registo paroquial, que o casal tenha tido mais filhos. Sabemos que em 1722 o casal está a viver no Moinho da Ponte Velha, pois é aí que toma como afilhado o filho de João Simões e Mariana Carvalha, que também aí moravam.

Ainda uma outra pessoa digna de interesse: Inácio Santiago. Este, natural da Freguesia do Chouto e morador no Moinho da Parreira em 1727, ano em que se casa com Josefa Maria, natural da freguesia de Vale Cavalos e moradora no mesmo local. Ambos já eram órfãos à data. Será ainda no Moinho da Parreira que, em 1731, será batizado Manuel, filho deste casal. Todavia, em 1737 irá morrer-lhes um outro filho, João, sendo nesta altura moradores já nos “Passos dos Negros”. Em 1739, ainda neste local, morre a própria Josefa Maria. Em 1740, no assento de casamento entre Domingos Álvares e Isabel Maria, de que Inácio Santiago é testemunha, é mencionado como morador nos “Passos dos Negros”. Irá voltar a casar, em 1741, com Mariana Dias (do Casal da Machuqueira – Lamarosa). Não é aqui referido onde vivia Inácio Santiago. Viveria ainda no mesmo local?

Para além destes, existem mais alguns assentos nos registos paroquiais que mencionam os “Passos dos Negros”, com os quais, contudo, não é possível estabelecer relações de continuidade, como fizemos até aqui. Em relação a batismos, temos notícia apenas de mais um, para além dos aludidos anteriormente. Foi em janeiro de 1718, de Josefa, filha de Manuel da Silva e Macária Maria. Está morrerá no mesmo ano, em 24 de novembro.

Já em relação aos assentos de óbitos, surgem-nos mais quatro de moradores nos “Passos dos Negros”: em 1715 o de Manuel Luís (casado com Sebastiana Dias), em 1727 o de António Marques, em 1736 o de Maria Martins e em 1738 o de Manuel, filho de Maria (o registo está danificado, e não é percetível os apelidos em questão).

No que diz respeito a casamentos, em 1724, um Manuel (cujo apelido não é percetível), aqui morador, é testemunha do matrimónio de Manuel Rodrigues (do Vale de Inferno) e Maria Nunes (dos Abobrais). Em 1728, Francisco Freitas, igualmente morador nos “Passos dos Negros”, é testemunha de casamento de António da Silva (de Lamego) e de Polónia da Silva (de Pombal). Sobre este último enlace, podemos levantar algumas interrogações, com a possível importância social dos noivos, visto que além dos serem de longe, a cerimónia foi cocelebrada pela Superior do Convento da Serra, o Padre Frei Alexandre da Purificação.

Por fim, e para encerrar este tema, resta-nos ainda abordar uma questão: o espaço dos “Passos dos Negros” tinha uma capela, dedicada a S. João Baptista. Contudo, verificamos que todas as cerimónias eram efetuadas aqui, mas sim na Igreja Paroquial de Santo António da Raposa. Exceção feita a dois casamentos, em 1715 e 1716, de que João Nunes é testemunha.  

* Surge como Maria Rodrigues quando o assento é feito pelo Padre Pedro de Barros e como Maria Roiz quando este é feito pelo Padre Manuel Ribeiro.

Bibliografia e Fontes:
(1706-1741). Livro dos defuntos, dos baptizados e dos casados – Raposa (Sto. António).
EVANGELISTA, Manuel (2011). Paço dos Negros da Ribeira de Muge: A Tacubis Romana. S/l: Edição do autor.



Com esta publicação, encerramos o propósito a que nos submetemos no início de 2014: publicar um tema por mês, todos os meses, sobre o Paço Real da Ribeira de Muge, no ano em que se assinalam 500 anos da sua conclusão. Clique na imagem para aceder ao índice com todos os temas.



sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

Como Interpretar e Valorizar o Património - Sessão Técnica na Escola de Hotelaria de Fátima - Parte IV

5. Turismo Cultural – uma alavanca para a valorização do património
Podemos entender por turismo cultural:
Aquele que é realizado por uma pessoa que se desloca por mais de um dia do seu lugar habitual de residência...
...por uma motivação cultural (conhecer bens patrimoniais, novas culturas, participar em eventos culturais, viagens para estudar a arte ou o folclore, etc.)...
...com um consumo de prestações de tipo cultural e de serviços de transporte, alojamento e restauração.

5.1. Tipos de Turismo Cultural

5.2. Capital Europeia da Cultura
A Capital Europeia da Cultura é um evento europeu que pretende colocar no mapa, durante um ano, uma cidade, em que tudo, a nível cultural, acontece. É um grande potenciador de receção de turistas, e há uma grande valorização das cidades e do património, para receber os visitantes, e que fica para depois da realização do evento.

5.3. Receção aos turistas
A receção ao turista é algo bastante importante, a todos os níveis, e o cultural não é exceção. Deve de existir um folheto, preferencialmente um mapa do local em questão, com qualidade não tanto de material, mas de conteúdos. O texto deve dar informações básicas sobre as atrações e deve ser sucinto.
Depois, poderá existir um nível de informação mais desenvolvido, uma brochura ou um livro, e que já deverá ser pago (contudo, deve ter-se em atenção os preços praticados – devem estar minimente adaptados ao que se está a vender).  


Em conclusão:

A melhor maneira de conservar o património é vivê-lo! 

Ver parte I aqui.
Ver parte II aqui.
Ver parte III aqui. 

quarta-feira, 3 de dezembro de 2014

Como Interpretar e Valorizar o Património - Sessão Técnica na Escola de Hotelaria de Fátima - Parte III

4. O tratamento do Património
4.1. Classificações oficiais
Sobre este tema, caiba a referência que ao longo dos tempos se alteraram constantemente as designações das classificações, sobre dos Monumentos de Interesse Municipal (que já foram Imóveis de Interesse Municipal e Imóveis de Valor Concelhio) e dos Monumentos de Interesse Público (que já foram Imóveis de Interesse Público).

4.1.1. Monumento de Interesse Municipal
São bens que têm um grande interesse sobretudo à escala local, isto é, não têm grande relevância no panorama nacional, contudo, têm uma forte importância a nível local, pelas mais diversas razões. Por esta razão, são classificações atribuídas pelos municípios. A existência de bens com esta classificação nos municípios está dependente da sensibilidade para as questões patrimoniais de quem os gere, e não tanto da existência ou não de património nos territórios.


Um exemplo poderá ser a Capela do Calvário, no concelho de Almeirim, que é um marco nas celebrações religiosas da Semana Santa na cidade. Por outro lado, podemos mencionar a Casa de Manuel Vieira Natividade, em Alcobaça, que marca o local onde viveu uma importante personalidade desta localidade do início do séc. XX.

4.1.2. Monumento de Interesse Público
Esta classificação é dada pelo poder central, neste momento pela DGPC, organismo estatal responsável pelo património nacional. Alguns exemplos que poderemos apontar serão o Pelourinho de Porto de Mós, uma Janela Manuelina, em Santarém, ou os Frescos de Santo Agostinho e de Santo Ambrósio, na Capela de Nossa Senhora da Conceição, concelho de Ourém. Sobre estes últimos, torna-se importante mencionar que a classificação é apenas dos frescos, e não da capela.

     

4.1.3. Monumentos Nacionais
Esta é a mais alta classificação atribuída pelo estado Português. Numa primeira fase da consciência patrimonial, sobretudo durante a Primeira República e o Estado Novo, era atribuída sobretudo aos grandes monumentos, associados aos grandes feitos da nação. São exemplos deste período o Castelo de Ourém ou a Torre das Cabaças, em Santarém.

Com o advento da nova consciência pelos bens patrimoniais, passaram a ser mais apertados os critérios de classificação, passando os bens que detêm esta classificação a ser conhecidos pela sua singularidade e importância coletiva. A recentemente classificada Sé de Leiria, juntamente com a Torre Sineira e a Casa do Sineiro, tem como particularidade o facto da Torre Sineira estar fisicamente separada e ainda relativamente distante do edifício principal da Sé. Apesar de não ser o fator determinante, foi este um dos aspetos que marcou a classificação deste edifício na cidade de Leiria.

4.1.4. Património da Humanidade
As classificações como Património da Humanidade são dadas pela UNESCO, organismo da ONU. São bens excecionais, para a humanidade, e que gozam de proteção internacional. Em Portugal existem 14 bens com esta classificação (entre culturais, naturais e mistos), aos quais se junta o Fado, como património imaterial da Humanidade. São exemplos, entre outros, os Mosteiros de Alcobaça e da Batalha e o Convento de Cristo, em Tomar.


4.2. Instituições que tratam e divulgam o património
4.2.1. Museu
O Museu é um lugar onde está exposto um determinado espólio. Esse mesmo espólio, pela maneira como é apresentado, um discurso ao visitante. A principal missão do museu é conservar, estudar e exibir os bens que tem à sua guarda. O Museu Joaquim Manso, na Nazaré, alberga um vasto acervo ligado não só à história daquela pequena região, mas sobretudo no que diz respeito à faina da pesca, indo o seu conteúdo dos trajes às embarcações. O Museu Arqueológico D. Diogo de Sousa, em Braga, construído por forma a preservar e valorizar uma ruína romana, apresenta ao público, para além desta dita ruína, incorporada no edifício, um vasto conjunto de vestígios que atestam a presença deste povo, e quem vão desde as lápides a marcos miliários.

4.2.2.  Território Museu
O território-museu é “uma zona que se mantém coesa por vínculos históricos, geográficos, com recursos patrimoniais e elementos que lhe conferem uma identidade própria” (Ballart e Juan, 2008:184 – tradução adaptada). Podemos referir, a título de exemplo, a vila de Evoramonte, cuja história está ligada ao acordo de paz que meteu cobro à Guerra Civil no início do séc. XIX. A Vila de Óbidos será um outro exemplo, onde para manter as características do povoado intramuralhas, a autarquia deu aos proprietários cal para serem pintados os edifícios. Um outro exemplo passível de enquadrar nesta categoria será a aldeia do Piódão. Em todos estes exemplos a experiência adquire-se sobretudo pela deambulação nos locais – no território.


4.2.3. Casas-museu
A casa-museu é um edifício tratado museologicamente, em que se mantém o estilo de habitação de determina personalidade ilustre que aí viveu, mantendo viva a sua memória e a importância que esta assume. Podemos assumir como exemplos a Casa-Museu Camilo Castelo Branco (em S. Miguel de Seide) ou a Casa-Museu Carlos Relvas (na Golegã).  
Poderá ser também uma casa típica de determinada comunidade, mostrando assim algumas das “tradições” domésticas da região onde se insere. Um exemplo será a Casa-Museu da Madalena, na Rebolaria (Batalha).

4.2.4.Centro de Interpretação
Os centros de interpretação utilizam variados meios (nomeadamente tecnológicos) para que o visitante possa ter conhecimento de determinado assunto ou facto. A grande diferença em relação aos museus é a sua ausência total ou parcial de espólio. Quando este existe, é relegado para um segundo plano. Podemos tomar como exemplo o Centro de Interpretação da Batalha de Aljubarrota. O espólio aqui existente do dia da batalha é bastante reduzido (alguns ossos encontrados em escavações arqueológicas e estruturas defensivas do dia da batalha), mas está aqui reunida bastante informação sobre a batalha, o movimento das tropas, a conjuntura que conduziu a esta e como ficou o país após este conflito. É igualmente mostrado ao visitante um espetáculo multimédia, onde o visitante asiste a uma reconstituição da batalha.

4.2.5. Património in situ
O património in situ é aquele que está edificado e que o visitante tem acesso no próprio local. Tem três níveis de tratamento.
O primeiro, mais básico, trata apenas em ter o património per si, sem nenhum apoio ao visitante. Pode estar aberto ou não. Um exemplo será a Capela da Sr.ª do Monte, nas Cortes – Leiria. Apesar de ser um edifício antigo, com uma dimensão histórica, religiosa e etnográfica, não consegue passar estes discurso, na sua grande parte, para os visitantes.
O segundo nível, complementar, assistimos a uma inclusão de alguns elementos que podem ajudar o visitante a compreender os locais que estão a visitar. Falamos da distribuição de mapas, colocação de sinalética (tanto indicativa de direções, como painéis explicativos). Um exemplo será a Quinta da Regaleira, onde à entrada é distribuído um mapa aos visitantes para que não só não se percam na imensidão do espaço, como também o possam compreender um pouco melhor.

O terceiro nível, a musealização, assistimos à criação de um discurso museográfico, inclusivamente algumas alterações no edifício para o albergar. Um dos exemplos que poderemos mencionar será a Sé de Braga, com o Museu do Tesouro da Sé. Para além do próprio bem patrimonial – a Sé – foi construído um museu, que alberga um largo espólio religioso deste local, e que cria um discurso ao visitante que permite conhecer melhor a mais antiga Sé portuguesa.


terça-feira, 2 de dezembro de 2014

Como Interpretar e Valorizar o Património - Sessão Técnica na Escola de Hotelaria de Fátima - Parte II

3. A importância do património

3.1. Para as comunidades
O património assume-se, antes de tudo, como um alicerce para as identidades. Com efeito, este é responsável pelos sentimentos de pertença e apenas se pode considerar património determinado bem quando a sua comunidade (seja um aldeia,  um bairro ou um país) se revê nele. Contudo, tudo isto não implica a perda de função turística do património – muito pelo contrário. A autenticidade das manifestações em torno do património trará mais benefícios para as comunidades que malefícios. 


Tomando como exemplo específico a procissão dos caracóis, no Reguengo do Fetal, esta será uma grande base da identidade da sua população, não só pela unicidade deste, com também pelo espirito de trabalho coletivo que encerra. Por outro lado, é pela sua própria singularidade e autenticidade com que ainda hoje se pratica que poderá despertar a vontade de ser conhecida e visitada por pessoas com motivações turísticas.

3.2. Para o turismo
O património assume-se essencialmente como um dos mais importantes produtos turísticos dentro da corrente do chamado “Novo Turismo”. Em oposição a este, o chamado “Turismo Tradicional”, muito virado para as massas e para o turismo de sol e mar, também já fazia uso do património, ainda que de uma forma pouco sustentada. Com efeito, do ponto de vista do turismo tradicional, podemos considerar o usufruto do património dentro do grande chavão das viagens organizadas em autocarros, em que estes despejavam cerca de 40 a 50 pessoas junto a grandes e vistosos monumentos e em que estes faziam visitas rápidas, devido à apertada agenda diária que por norma norteiam estes grupos. Assim, não existe tempo para deixar divisas junto do comércio tradicional, nomeadamente em restauração com gastronomia típica (uma outra forma de património muitas vezes gorada), ou nas lojas de souvenirs.



Por outro lado, associado ao conceito de must see sight (aquilo que tem de ser visto), existe uma grande sobrecarga dos destinos ou de certos pontos destes, onde há uma exacerbada vontade de  mostrar que se esteve em determinado local. É o caso, por exemplo, da Torre Eiffel, em Paris, em que são mais que comuns as fotos com esta em pano de fundo. 

segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

Como Interpretar e Valorizar o Património - Sessão Técnica na Escola de Hotelaria de Fátima - Parte I

1. O que é o património
Antes de tudo importa perceber a origem do termo “património” para perceber o que quer dizer. “Património” é uma palavra composta, derivada de dois étimos latinos (pater+monium). Pater quer dizer “pais” e monium “herança”. O património quer dizer assim aquilo que provém dos pais, não no sentido da conceção física, mas sim da herança social que recebemos dos nossos antepassados.

Para além disto, importa perceber que o património tem sempre uma dimensão imaterial. Pegando num exemplo concreto – um castelo – este resulta de um amontoado ordeiro de pedras. Contudo, essas pedras têm uma importância, pelo papel que assumiram na defesa de determinada localidade. Contudo, não deixam de ser pedras. É o que está para lá das pedras, ou seja, o papel que assumiu na história, que tornam aquele castelo importante, e é essa sua dimensão – imaterial – que o tornam património.



Quando nasceu a preocupação pela conservação e defesa do património, passou a considerar-se como bem patrimonial os grandes monumentos, associados aos grandes feitos da nação, com um forte valor artístico. Um destes exemplos será o do Mosteiro da Batalha, uma obra-prima do gótico português, associada à Batalha de Aljubarrota (onde se consolidou a independência de Portugal) e onde nasceu a corrente decorativa do início do séc. XVI – o Manuelino. Contudo, num alargamento do conceito de património, passou a considerar-se como centralidade do património a atividade quotidiana do homem. A arte vernácula, ou seja, a produção artesanal de bens, assume aqui um papel preponderante, aliado à forte componente imaterial que os bens têm. São exemplos objetos domésticos ou os próprios “saber-fazer”.

Um bem poderá ser considerado património quando o seu valor simbólico ultrapassar o seu valor de uso e formal, isto é, quando não tiver um “preço”. Quando o seu valor for de tal ordem, que não exista vontade de o alienar e que esse cenário não seja sequer posto em questão.


2. Que tipos de património existem?
Em primeiro lugar, não temos o hábito, por preciosismo académico, utilizar o termo “património cultural”, por considerarmos, a par com alguns investigadores da área, que todo o património tem uma dimensão cultural, pelo que essa mesma designação resultará numa redundância.

O património pode dividir-se em material e imaterial. Contudo, como já referimos, um determinado bem pode ter uma dimensão material e imaterial, sendo esta forma imaterial o que confere a importância a determinado bem. No campo do património material, podemos encontrar, entre outras, as seguintes tipologias de património:

- Industrial (moinhos, lagares, adegas, unidades fabris)
- Militar (fortes, castelos, muralhas)
- Religioso (igrejas, capelas, imagens de santos)
- Artístico (pinturas, arquitetura, esculturas)
- Natural (praias, pegadas de dinossáurios, matas)
- Urbano e Civil (palácios, solares, estátuas, pontes)
- Científico (antigos laboratórios)
- Administrativo e estatal (tribunais, Assembleia da República)
- Arqueológico (ruínas romanas e por definição todo o bem que tem mais de cem anos).

 

De todos estes, o património natural é o único em que não há intervenção do homem, tendo este apenas o papel de o conservar. No que diz respeito ao património imaterial, podemos encontrar as seguintes tipologias:

- Música (fado, fandango, verde-gaio, entre outros)
- Dança (associada à música que se pode dançar – o caso do fandango e do verde-gaio).
- Gastronómico (o património que se destina a ser comido – logo material. Todavia, o património encontra-se na mão do cozinheiro que produz o prato, isto é, no saber fazer).
- Ritos Religiosos (procissões, via-sacra)
- Estórias (contos, vivências dos tempos antepassados, anedotas)
- Lendas.



Da mesma forma que não existe, muitas vezes, uma fronteira entre o património material e imaterial, esta esbate-se ainda mais entre as várias tipologias de património. Com efeito, um mesmo bem – por exemplo os Painéis de S. Vicente de Fora, atribuídos a Nuno Gonçalves – é ao mesmo tempo património religioso (por fazerem parte do retábulo de uma igreja) e artístico (tendo em conta que são uma pintura, expressão da arte de uma época específica). Tendo presente que todo o bem com mais de cem anos é arqueológico por definição, podemos ainda considerar este bem como sendo património arqueológico.


Por esta forma, podemos considerar o património como algo pontuado pela diversidade e pela versatilidade.

terça-feira, 25 de novembro de 2014

Hoje assinalam-se 500 anos da conclusão do Paço Real da Ribeira de Muge


Sejam certos os que esta carta virem como é verdade que Diogo Rodrigues almoxarife dos Paços da Ribeira de Muja recebeu de Rui Leite tesoureiro da casa del rei nosso senhor seis sacos d’irlanda …/… e assim três alcatifas de Castela, a saber: uma delas de vinte e cinco palmos que foi avaliada em três mil e seiscentos réis e outra de vinte palmos que foi avaliada em dois mil e oitocentos réis e outra de doze palmos que foi avaliada em mil e quinhentos réis as quais alcatifas são de Castela as quais coisas lhe foram entregues por Duarte Fernandes reposteiro do dito senhor e por que é verdade que do dito Rui leite recebeu as coisas sobre ditas lhe mandou fosse feita neste almoxarifado por mim Antão Fernandes escrivão que os sobre ele dito Diogo Rodrigues carreguei em receita. Feita em Almeirim aos 25 dias de Novembro de 1514. Diogo Rodrigues. Antão Fernandes

Não tendo nós conhecimento da data de inauguração do Paço Real da Ribeira de Muge (se é que houve uma inauguração oficial), podemos fixar como o dia de hoje de há 500 anos atrás o dia da conclusão deste paço. Porque é neste dia que temos conhecimento que foram entregues umas alcatifas, a que se refere o documento transcrito acima, e é este o último registo que encontramos relativo à construção/ edificação do paço. Nesta altura, estando já a receber recheio, podemos inferir que já estariam as obras concluídas e o espaço pronto a habitar. 


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